A
escola é um ambiente repressivo. As escolas convencionais, dotadas das
estruturas que os educadores estão fartos de conhecer servem pra alinhar os
alunos com os interesses da classe dirigente. É assim dentro do sistema
capital, que move nossas instituições a seu bel-prazer. Na escola pública
municipal, isso toma dimensões absurdas. É a escola do não, da negação dos
prazeres e das vivências. Tudo isso recheados com uma direção acovardada pelas coordenadorias
e por professores sem condições de trabalho, mal remunerados e por isso mal
humorados, sem paciência com crianças que não tem limites, porque também por
suas vezes não tem estrutura alguma, nem familiar, nem nutricional, nem
institucional.
Em
meio a esse cenário, na primeira semana de outubro do ano de 2011, presenciei
um fato marcante, pelo menos pra mim. Estava eu em minha sala de terceiro ano
primário, com meus aluninhos quando uma outra professora do CIEP veio até a mim
e pediu para que eu olhasse a sua sala, mas fingindo estar fazendo outra coisa.
Em suma, queria que eu chegasse na surdina pra que eu pudesse ver uma
determinada cena. Que cena era essa? Uma das alunas, que tem entre nove e dez
anos, de nome Maria, que por acaso é uma das mais indisciplinadas daquela
turma, porque não está dentro dos padrões, porque não acata ordens, porque não
aceita autoridade, nem hierarquia, essa aluna estava encaixada com seu quadril
na quina da mesa. Com seus pezinhos pequenininhos pra cima, fazia movimentos
pélvicos regulares, lentos, sem se importar muito com o que estivesse
acontecendo.
Ficou claro
que a professora, pelo menos me pareceu, não estava atenta à intensidade
daquele gesto. Eu poderia chegar com um caminhão que a concentração da moça não
se abalaria. A turma estava agitada, nenhum dos alunos deu muita atenção, mas
os adultos logo se chocaram com a busca do prazer de Maria. E ela ficou ali,
encaixada nesse movimento. Eu não presenciei até o final, mas a professora da
turma confidenciou depois que depois de um certo tempo a aluna deu aquela
tremidinha e logo depois saiu da quina da mesa. Ora, chegamos a conclusão que a
pequena Maria atingiu um orgasmo, um gozo.
Ora, não sei
quanto a vocês, mas o gozo de Maria é uma sinalização claríssima. Nossos alunos
tem potenciais tremendos. Quantos de nós, civilizados e aburguesados temos a
condição sociológica de buscarmos o gozo de modo tão pueril? A sociedade nos
obriga, para sermos levados a sério, para sermos aceitos como bons cidadãos,
para sermos vistos como modelo, devemos negar nossos instintos, devemos perder
aquilo que nos torna humanos, devemos ser mal humorados e devemos, além de
tudo, dependendo das nossas posições, castrar o gozo alheio. Ora, por mais
professor que eu seja, por mais que eu esteja submetido a uma direção que tende
a pasteurizar o alunato, não se pode impedir-me de glorificar o gozo de Maria.
Maria, para a
Secretaria de Educação está estudando, para no futuro ser uma boa doméstica, ou
uma boa atendente do Mc Donald’s. Em sua turma, existem alguns alunos que
precisavam de um acompanhamento psicológico agudo. Famílias que precisam do
básico, que não tem o básico. Saúde, alimentação, moradia digna, saneamento e
tudo que o governo poderia lhes oferecer. E nisso, a direção da escola tenta
fazer o possível, mas é pouco. Os professores são tão oprimidos quanto Maria.
Ficam muito receosos em contrariar ordens expressas de uma direção que nesse
sentido se mostra alinhada com a ordem. Ah, a ordem. Quanto devemos nos privar,
por uma ordem que só é respeitada nos baixos estratos? Ou alguém duvida da
quantidade de cocaína que corre nos espaços mais abastados? Temos listas
completas de celebridades movidas a pó, mas a eles nunca é exigido o respeito a
ordem. Na verdade, vejo no gozo de Maria uma resposta a tudo isso, ela
simplesmente ligou o foda-se e gozou na quina da mesa. Não que isso faça dela
uma aluna melhor, ou com um futuro melhor, mas espero que ela consiga gozar
mais vezes, espero sinceramente que ela goze mais do que quem tenta
recriminá-la.